19.8.09

Não posso ficar em casa que cozinho e escrevo pelos cotovelos...quase que compulsivamente... Os comentários sobre o post anterior (o do Marley, não o da lasanha) me fizeram pensar sobre qual foi a última vez em que chorei dolorosamente.Não foi pela perda de alguém, foi algo um tanto mais complexo.
No início do ano passado enquanto eu filmava o documentário sobre a Aids, passei diversas manhãs entrevistando pacientes no ambulatório de uma clínica de atendimento especializado. Foram inúmeras histórias de vida e eu confesso que saía derrubada de lá, por melhor que eles encarem conviver com o vírus. São pessoas de todas as idades, raças, credos e condições econômicas. Alí vemos escancaradas todas as facetas do ser humano. O que de mais imperdoável vi, foram mulheres infectadas por parceiros que sabiam que eram portadores e mesmo assim não protegeram as parceiras.Mas isso é assunto prá outro post.
E foi num desses dias que eu começei a conversar com um rapaz de 19 anos na sala de espera.Ele não quis gravar uma entrevista, mas no bate papo informal, me contou como era ser homossexual, a família que teimava em negar sua opção, o preconceito, os amigos e tal. Contou que fazia o exame periodicamente, mas que estava tranquilo pq se cuidava. Ele falava animado de todos os seus projetos de vida. Dava gosto de ver tanta jovialidade e um rosto tão cheio de esperanças.
Entrei para uma entrevista e ele para a sua consulta. Eu estava saindo da entrevista, ainda no corredor, carregando numa mão a câmera e na outra uns papéis, quando encontrei-o novamente. Ele vinha de cabeça baixa e e num rompante me abraçou forte e começou à chorar. Fiquei totalmente sem ação, nem o abraço eu podia retribuir porque estava com as duas mãos carregadas.Eu fiquei lá parada, em silêncio, naquele enorme e frio corredor cinza claro.Não sei quanto tempo se passou, mas seu choro era tão dolorido que aqueles segundos, ou minutos, pareceram uma vida inteira.Num dado momento a médica abriu a porta do consultório e o chamou de volta. Ele tirou os braços que me envolviam fortemente e me agradeceu.Ele se afastou, mas o peso ficou ainda em meus ombros.
Me despedi das pessoas da clínica e fui para o carro. Sentei-me em frente à direção, virei a chave, liguei o motor e lá fiquei. Ao invés de dar marcha à ré e sair, eu chorei, chorei, chorei até me acabar.Chorei por ele, por mim, por todos os outros, pelas esposas, pelas crianças e pelas famílias inteiras que lá conheci. Chorei por cada história que me contaram. Chorei por todo o preconceito e por tantas vidas interrompidas.Chorei de revolta, de raiva e de amor.Aquilo não era um filme, era vida real.

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