O que me motiva nesta vida são as viagens que eu ainda quero fazer.
O critério de escolha dos lugares não segue a lógica normal dos simples mortais.
Então eu havia decidido que queria conhecer a região dos lagos no Chile e tomar um whisky com gelo da geleira. Mas entre falar inglês ou espanhol, ou castelhano, sou mil vezes mais falar inglês. Tenho muita dificuldade com a língua espanhola e a francesa.Fora que custo benefício, prefiro atravessar o Atlântico.
Depois pensei em ir pra a antiga Bessarábia, terra dos meus antepassados maternos, hoje dividida entre Moldávia e Ucrânia.Iria especificamente para Chisinau, chamada pelos russos de Kishnev. Meus antepassados, os que sobraram, mudaram-se para Kiev ainda durante o Império Czarista, fugindo da perseguição imposta aos judeus:
"O censo de 1856 registrou a presença de 78 mil e 700 judeus, oito por cento do total da população da Bessarábia, que tinha cerca de 900 mil habitantes. O número de judeus foi crescendo em ritmo acelerado, notadamente na cidade de Kishinev onde, no início do século 20, viviam 50 mil judeus, correspondendo a 46 por cento do total.
A primeira e grande tragédia dos judeus bessarabianos aconteceu no dia 16 de fevereiro de 1903, em Kishinev, onde havia uma florescente comunidade, com 110 mil almas.
Suas atividades sociais e culturais eram intensas e ali se contavam 16 escolas judaicas e um bom hospital, além da publicação de periódicos no idioma iídiche.
Naquele dia, um menino cristão foi encontrado assassinado a 12 quilômetros ao norte da cidade, às margens do rio Dniester. As autoridades locais afirmaram que o garoto tinha sido vítima de um ritual judaico destinado a extrair seu sangue para a fabricação de matzot (pães ázimos consumidos na festa do Pessach, a celebração do Êxodo). Os governantes sabiam que o menino havia sido morto por um parente, conforme este mesmo logo confessou.
No entanto, apegaram-se à mentira do ritual judaico, incitando e levando à histeria a população não-judaica da cidade, sobretudo por causa dos virulentos textos contidos em um jornal local de conhecida postura anti-semita, publicado em idioma russo. Começou, então, um pogrom (assassinato de judeus), que durou três dias, porque o ministro do interior, Viacheslav Plehve, nada fez para impedir a matança. As notícias referentes ao pogrom desencadearam protestos de governos ocidentais, porém a tragédia já estava consumada: 49 mortos, 500 feridos e 700 casas destruídas ou incendiadas.
Vladimir Korolenko (1853-1921), escritor e jornalista russo não-judeu, esteve em Kishinev dois meses depois do massacre, quando, conforme escreveu, "seus ecos ainda reverberavam". Seu relato é impressionante. Ele narra que percorreu as ruas da cidade e conversou com dezenas de judeus e não-judeus "pelo menos para entender o que havia acontecido".
Acentuou que não encontrou nenhum motivo para aquela explosão de bestialidade e indagou-se como era possível que pessoas em princípio decentes pudessem de súbito se transformar em verdadeiros animais selvagens.
Em seguida escreveu: "Desejo que os leitores possam refletir sobre o sentimento de horror que de mim se apossou durante minha permanência em Kishinev. Espero que a justiça encontre uma resposta, mas dificilmente isto vai acontecer".
Em 1905, quando ocorreu a primeira revolução russa, os pogroms se repetiram em toda a Bessarábia e, mais uma vez, uma das localidades mais visadas foi Kishinev. Desta vez, porém, embora os judeus tivessem organizado um sistema de defesa, 19 morreram e 56 ficaram feridos. Este segundo massacre deu origem ao célebre poema, Be-ir Ha-Haregá (A Cidade da Matança), escrito em hebraico pelo grande poeta Chaim Nachman Bialik, que assim termina: Por causa da sucessão de trágicas mortes e violências, milhares de judeus da Bessarábia emigraram para a antiga Palestina, Estados Unidos, Europa Ocidental e diferentes países da América do Sul.
Após a vitoriosa revolução russa de 1917, a Bessarábia foi incorporada ao domínio soviético. Os novos governantes aboliram muitas das restrições aplicadas aos judeus, porém sua tranqüilidade pouco durou. No ano seguinte, os bolcheviques perderam a Bessarábia para a Romênia, que a possuiu de 1918 a 1940." (Zevi Ghivelder)
Ao ler sobre a matança de judeus em Kishinev, desisti de visitar o lugar, bad Karma.
Quando vieram para o Brasil em 1917, mais uma vez fugindo de perseguições, afinal meu bisavó foi capitão da guarda do Czar, tanto minha bisavó como meu bisavó entraram como romenos e meu avó como russo.Ou seja, decidi riscar do mapa esses dois lugares.
Depois de tudo isto, acho que escolhi minha próxima parada: a Islândia, vou ver a aurora boreal.
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