25.3.10

Nem tudo é motivo de comemoração nos dias de hoje. Outro dia recebi um e-mail que falava sobre uma menininha que me deixou alguns dias calada. Precisei de um tempo para poder tocar no assunto.Nessas horas eu bem que gostaria de possuir os mil braços de Chenrezig, Buda da Compaixão.
Numa semana em que fala-se tanto do caso da menina Isabella Nardoni, que supostamente foi assassinada pelo pai ou pela madrasta, o outro caso não me sai da cabeça.Abaixo reproduzo um trecho da matéria escrita por Laura Capriglione para o jornal "Folha de São Paulo" em 21/03/2010
"A menina 23225 **é assim que ela está registrada nos prontuários médicos**foi internada aos 11 anos no Hospital Psiquiátrico Pinel. "Inteligente, agressiva, indisciplinada, sem respeito, fria e calculista", escreveram dela os que a levaram à instituição-símbolo da doença mental de São Paulo. Psiquiatras, enfermeiros e psicólogos do Pinel logo viram que o caso de 23225 dispensava internação. Deram-lhe alta.
Mas como a garotinha não tem quem a queira por perto, já são mais de 1.500 dias, ou 4 anos e três meses esquecida dentro da instituição.A menina não é psicótica ou esquizóide; não é do tipo que ouve vozes ou vê o que não existe. Uma médica do hospital resumiu assim o problema: "O mal dela é abandono".
Em termos técnicos, 23225 foi catalogada no Código Internacional de Doenças como sendo F91, que designa transtorno de conduta (desde agressividade até atitudes desafiantes e de oposição). Miudinha, cabelos cacheados, 23225 tinha apenas quatro anos quando a avó colocou-a em um abrigo para crianças de famílias desestruturadas. O ciúme, diz a mulher, vai acabar com ela. Era só 23225 ver outra criança recebendo carinho e armava uma cena. Jogava-se no chão, chorava. Virou "difícil".
Até os sete anos, a menina não conhecia a mãe, que cumpria pena por roubo e tráfico de drogas. A mulher é usuária de crack. Reincidente, enfrenta agora outra temporada de sete anos atrás das grades. O primeiro encontro das duas foi um desastre. Uma saía da Penitenciária Feminina, a outra a esperava, vestidinho branco, e um buquê de flores para entregar. A mulher xingou a filha e o buquê ficou no chão.
No dia 8 de novembro de 2005, o abrigo conseguiu que um juiz internasse 23225 na Clínica de Infância e Adolescência do Pinel, voltada para quadros psiquiátricos agudos.(...)
À Folha, a avó da menina, evangélica da igreja Deus é Amor, disse que acaba de conseguir um emprego com carteira assinada (serviços gerais, R$ 480 por mês). "Não vou pôr a perder por causa dela". Certa vez, em fuga do Pinel, 23225 deitou-se no meio da rua em que mora a avó, queria morrer atropelada: "Eu tinha acabado de dizer que aqui ela não podia ficar".
O diretor do Pinel pediu a todos os santos dos abrigos: à Associação Aliança de Misericórdia, Parque Taipas, à Associação Lar São Francisco na Providência de Deus, ao Instituto de Amparo à Criança Asas Brancas, de Taboão da Serra, ao Abrigo Irmãos Genésio Dalmônico, ao Abrigo Bete Saider, em Pirituba, à Associação Santa Terezinha, ao Abrigo Amen-4, entre outros, que arrumassem uma vaga para 23225 viver.
A menina moraria no abrigo, poderia frequentar uma escola, e receberia atendimento psiquiátrico ambulatorial em um Centro de Atendimento Psicossocial mantido pela Secretaria Municipal de Saúde. Não deu certo. Ou os abrigos alegavam não ter vagas, ou diziam não ter vagas para alguém com o histórico Pinel. "
Para mais, acesse o restante da matéria
aqui.
Mas o que fica de tudo isso é o abandono geral de nossas crianças.Afinal Isabella não foi a única criança vergonhosamente assassinada nos últimos anos e nem 23225 é a única criança vivendo desta forma, negligenciada.Aonde foram parar palavras como carinho, amor e cuidado? É muito descaso.

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